Renato Morcatti apresenta série de trabalhos inéditos inspirados em sua persona drag queen, Tara Wells, que ele encarnou nos anos 1990 em BH.
Ao retomá-la no presente, Morcatti observa que ela traz um potencial questionador ainda consistente e opera uma afirmação da vida e sua celebração.
Referências a Tara permeiam toda a mostra, desde a instalação no Espaço Vitrine - aos estandartes expostos no interior da galeria.
Para essa instalação, Morcatti relata que também se inspirou no romance A Metamorfose de Franz Kafka. "Eu reli esse livro recentemente, e várias coisas me chamaram atenção. Uma delas é que as transformações vão acontecendo não só no corpo do personagem, o Gregor Samsa, mas também na própria casa que ele habita", pontua o artista.
Isso o motivou a construir um trabalho que também pudesse incorporar um pouco dessa transição, por isso a escolha de usar o papel de seda em uma escultura chamada "Mariposa".
"A ideia é que ali na vitrine, junto com diversos outros objetos que nos transportam para o ateliê de uma drag queen, a 'Mariposa' esteja mesmo bastante vulnerável porque ali bate sol e o material é delicado. Então, o trabalho também poderá se modificar, se transformando ao longo do tempo."
A instalação também faz referência ao jornal gay Lampião d Esquina, pioneiro em reivindicar direitos a LGBT na virada d década de 1970 para 1980.
Nos estandartes, peças de grande proporção, algumas ultrapassando 2 m de altura por 1,10 de largura, além das citações visuais à personagem Tara Wells, podem também ser encontrados processos, que, novamente, reforçam o interesse de Morcatti pela dinâmica da transformação.
"Esses trabalhos são feitos em tecido, que eu vou tingindo depois alvejando. Eu vou brincando com essa matéria, dando nós, rasgando. Eu gosto de ver como a matéria vai se acumulando, ganhando uma dimensão no espaço e também se transformando", afirma Morcatti.
Na série "Guia", composta por oito destes estandartes, Morcatti reproduz os azulejos de cerâmica pintada, "pele" que reveste grande parte da casa que habita, explica o artista.
Em algumas destas obras o artista representa a planta baixa de sua casa, utilizando tiras rasgadas de tecido tingido de vermelho. O que também remete ao próprio título da exposição.
"O termo 'ilê' é uma gíria no meio gay, conhecida no dialeto pajubá, para se referir a casa. E essa palavra vem da língua iorubá, na qual também significa 'interior de uma casa", explica Morcatti.