Em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial da Saúde fez história ao tirar do código de doenças a homo e bissexualidade. Como forma de deixar marcada essa conquista, foi criado, em 2004, o Dia Internacional contra a Homofobia.
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Estamos, agora, 13 anos depois com histórico de avanços, retrocessos e questões que ainda desafiam o movimento arco-íris. O diagnóstico vem da avaliação de alguns do mais importantes ativistas LGBT do Brasil, que atuavam em 2004 e que continuam a trabalhar para que haja mais comemorações. Que elas venham!
Toni Reis - presidente da Aliança Nacional LGBTI
"Nestes 13 anos, muita coisa melhorou. Principalmente porque as pessoas LGBTI estão se assumindo mais e com mais coragem de denunciar a discriminação. Passa muito menos coisa em branco. Também, os nossos adversários são mais nítidos. O fundamentalismo religioso e a extrema direita também saíram do armário em relação às pessoas LGBTI. Isto é bom, porque sabemos com quem estamos lidando. Está acabando a hipocrisia do 'finjo que não sou e você finge que não sabe'. Estamos todos/as na arena.
Temos sete ações no Supremo Tribunal Federal, que tem sido um guardião da nossa dignidade. E no Congresso Nacional, a Comissão de Cidadania e Justiça do Senado Federal aprovou recentemente a proposta de casamento homossexual. Isso foi fruto de muitas mãos e da visibilidade que conseguimos."
Luiz Mott - presidente de honra do Grupo Gay da Bahia
"O Brasil e o mundo continuam contraditórios, com avanços e retrocessos, na consolidação da cidadania LGBT. Houve progressos importantes como casamento igualitário e adoção. É o lado cor de rosa de nossa história. A mídia, apesar de resistir a referir-se no feminino às trans (travestis e transexuais), já não utiliza de expressões depreciativas para se referir a LGBT.
A TV e cinema cada vez mostram mais o universo homoerótico. A internet favoreceu substantivamente a denúncia de violações dos direitos e divulgação de conquistas LGBT. A declaração do Papa 'quem somos nós para julgar os gays' é fundamental como indicador de melhores tempos para nossa população, malgrado a radicalização na Chechênia e no mundo islâmico.
Contudo, persiste o lado vermelho sangue: a violência e assassinatos contra LGBT vêm aumentando no Brasil e sobretudo nos países subdesenvolvidos. Constata-se uma preocupante regularidade sociológica, quanto mais liberação LGBT, maior a violência dos intolerantes. Continuamos porém a luta pela isonomia: cotas sociais, e não apenas raciais também para LGBT e equiparação da homofobia ao crime de racismo. E a liberação do kit contra homofobia.“
Tathiane Araújo - presidente da Rede Trans Brasil
"Observamos que houve pouca evolução na gestão, pois nenhum programa de governo colocou as vidas da população LGBT acima dos interesses e acordos políticos. A prova de que pouco mudou são os retrocessos atuais motívados pela falta de avanço legal.
Estamos atrasados até para países da América do Sul, muito mais atrás em diversas questões legislativas. No que diz respeito a legislação para LGBT, Argentina, Uruguai e Colômbia já nos ultrapassaram. No judiciário, vimos avanços, embora cautelosos, o que nos remete a cada vez mais a sentir a necessidade de fazer entender cada demanda e realizar um advocacy (defesa de uma causa social) responsável e efetivo. Esse é o nosso desafio diário e ao qual temos procurado atender."
Claudio Nascimento - ex-coordenador do programa estadual Rio Sem Homofobia
"Vimos a ONU assumir postura próxima de defesa dos direitos LGBT e o posicionamento de autoridades importantes, como o primeiro-ministro do Canadá [Justin Trudeau], que se posicionou a favor dos direitos LGBT, mas também o massacre na boate Pulse de Orlando (2016), a eleição de Donald Trump e questões de vários países islâmicos e de terrorismo que perseguem LGBT. A gente vê, portanto, avanços, mas também muitas questões de violações de direitos. É uma luta de idas e vindas, de conquistas e retrocessos.
No plano local, apesar de no governo Dilma termos fortalecido o Conselho de Combate a Discriminação de LGBT, é preciso agora que além do plano de intenção, elas se tornem propostas concretas. E no governo Temer não temos ainda uma agenda que possa nos mostrar que vai haver um diferencial. Não acredito que tenhamos nenhum avanço nesses próximos dois anos. Não temos ainda uma lei que criminalize a homofobia e políticas em todos os Estados e municípios para servir de rede de proteção. Vivenciamos um momento de conquistas, no âmbito da visibilidade, mas ainda há muito que se conquistar em efetivação de políticas públicas."
Keila Simpson - presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra)
"É óbvio que houve evolução, temos um cenário completamente diferente se pensarmos no Brasil de hoje e naquele de 1990. Mas acredito que é um momento em que precisamos ficar bem atentos e continuar batalhando. Mesmo na dificuldade, precisamos realinhar as lutas. O cenário é muito difícil e temos uma população - especialmente as trans, que represento - que foi alijada de parte de seus direitos.
Precisamos, claro, comemorar as vitórias individuais como se fossem coletivas e conseguir avançar mais do que conseguimos até agora. O movimento LGBT tem suas pautas específicas e nossos aliados são poucos dentro do cenário nacional. E há ainda uma divisão tremenda dentro do movimento LGBT, com filiações partidárias que trazem dificuldades para conciliar uma unidade.
É preciso pensar um pouco para além das legendas de partido nesse 17 de maio e procurar o que realmente é importante fazer para diminuir os assassinatos que afetam essa população, e reagir frente ao retrocesso nas pautas nacionais e as regressões que vêm acontecendo."
Yone Lindgren - Coordenadora política nacional da Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL)
Acho que tivemos uma involução muito grande, que está demonstrada por todas as políticas criadas, implementadas ou solicitada por nós, inclusive no programa Brasil sem Homofobia. Tínhamos tanta coisa e não temos quase nada, fora que no mundo também está dando tudo errado, andando para trás. Eu acredito que a gente vá ter que ir muito à luta de novo.
Tenho certeza que infelizmente grande parte da militância se acomodou em partidarismo, em empregos, cada um olhando para o próprio ego. E isso foi deixando espaço para quem queria desfazer o que tínhamos feito ou não nos deixar concretizar as propostas que já estavam tão evoluídas e que já estavam em ação.