Por Julia Bartsch*
Estas eleições foram, sem dúvida, as que mais afetaram emocionalmente a população em geral nos últimos anos. Ódio é um sentimento que leva a negar a realidade e esta é uma das razões para que muitos tenham se desgastado em argumentos factuais para fazer revelar os perigos atrás de determinados discursos e candidaturas.
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No caso da comunidade LGBT, um dos alvos diretos desses discursos, aqueles que se viram atingidos entenderam que a coexistência com pessoas que compactuavam com o então candidato de falas homofóbicas não seria fácil.
Viriam à tona, então, histórias individuais, fantasmas adormecidos que esperavam à espreita o tombar da ilusão de que estava tudo bem, de uma tolerância dissimulada. Estar ao lado deste candidato era estar contra eles.
E era necessário até mesmo lembrar daqueles 29% dos eleitores LGBT que declararam voto ao candidato vencedor destas eleições. Uma explicação possível é a de que, dentro de uma cultura pouco habituada à reflexão, todas as pessoas são permeadas por discursos, hábitos e costumes similares. Assim, da mesma maneira que teremos mulheres machistas, teremos gays homofóbicos, por mais contraditório que pareça. Mas e agora?
O primeiro passo é se perguntar: o que eu desejava? Dentre aquelas pessoas próximas cujo voto provocou alguma decepção, esperava-se algo diferente? Um dos motivos de sofrimento é ter se dado conta de que aquele sentimento negativo sobre a não aceitação da sexualidade de alguém não se reverteria como se havia sonhado. Muito pelo contrário, confirmou-se, trazendo desilusão.
O segundo passo é olhar para os resultados positivos desse processo. Sim, eles existem! Estas eleições, se de um lado deram o tom de até onde é possível sustentar algumas relações, permitiram saber melhor com quem é possível estar, trocar, coexistir.
A saída aí é cercar-se de quem faz bem e que possam ajudar a olhar para o melhor de si, sejam novos amigos descobertos, velhas amizades que se confirmam, o suporte psicológico com ferramentas adequadas, encontrar dispositivos não violentos a fim de proteger-se da violência que ora se escancara.
Se não ter o amor na medida idealizada por parte de alguns causa desamparo e tristeza, é no fortalecimento de laços sociais possíveis que se restabelece a autoestima, a dignidade e a certeza de que toda forma de amor vale a pena, ainda que digam o contrário.
*Julia Bartsch é psicanalista e psicóloga formada pela Universidade São Marcos (SP) em 2005. Além da atuação no consultório e atenção a populações em risco social em diferentes projetos em São Paulo, desde 2008 tem se dedicado a projetos em saúde mental junto a grandes organizações humanitárias internacionais. Trabalhou em países como Honduras, Chade, República Democrática do Congo, Libéria, Guiné e Sudão do Sul em contextos de violência urbana, conflito armado, violência sexual e baseada em gênero e grandes epidemias. Seu trabalho também envolve prestar suporte psicossocial a brasileiros fora do País e a estrangeiros em processo de adaptação no Brasil. Contatos: [email protected] e site www.saberolharpsi.com