Por Welton Trindade
Não falemos do óbvio: Pabllo Vittar é um tapa na cara de quem empunha a homofobia. Tratemos do que é pouco dito, mas necessário: ela também é um supapo em quem tenta, de dentro do movimento LGBT, nos autofragmentar.
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É cada vez mais sentido um discurso pernicioso que insiste em mensurar dor e criar rankings de discriminações dentre LGBT.
O efeito é tão perverso quanto sorrateiro: é como se alguma dor da discriminação pudesse ser relevada, esquecida, menosprezada. "Ah, reclame não, porque o outro segmento..."
Sabe o que também assusta? Que esse tipo de comentário cabe muito na boca cheia de fel de muitas pessoas que discriminam LGBT. "Que mané crimes de ódio no Brasil... Isso é mimimi."
Pois quem ranqueia dor tem essa mesma atitude desumana. Não tem diferença. Não mesmo!
A fragmentação tentada (e tão enfraquecedora de todos e todas nós LGBT) é de forma terrorista também empreendida quando se racializa, coloca em termos de gênero, compleição física e de classe social as discriminações sofridas por nós.
Vem daí algo como um tal "Ah, mas branco gay... ", "Nem venha dizer nada desse privilegiado...", "Ah, gordo é quem representa mais... " Ranking de dor? Privilégio de ser discriminado? Privilégio de ser atacado verbal e fisicamente? Devemos atacar a nós mesmos?
Mas sejamos tão simples quanto uma letra vittarina: esses discursos acima nos colocam como uma pessoa sem os dentes caninos e outra sem os incisivos aos berros em briga para saber quem sofre mais.
A proposta é: unamo-nos e procuremos um serviço dentário para ambos! Pois os dois sofrem! Negrita-se: unamo-nos! O inimigo está lá fora! E a solução, em nossa soma!
E onde entra em tudo isso a persona Pabllo Vittar, que deu a letra na cena musical e LGBT em 2017?
Comecemos pela constatação que beira a unanimidade dentre nós LGBT (sem entrar em contendas sobre qualidade vocal): Pabllo simplesmente marcou já uma geração de LGBT!
Não se pode mais contar a história de nossa cultura e luta sem boas e estrondosas páginas para ela.
Quando um jovem gay coloca a foto da cantora no bolo de aniversário, beija o namorado e depois é vítima até de ameaças de morte... Quando um show dela em uma loja reúne milhares e milhares de pessoas... Está-se tratando de um marco! De um ícone que já é!
Fixemos então: Vittar hoje colabora de forma imperiosa para visibilizar a causa LGBT, nos empoderar como indivíduos e grupo social, e superarmos a discriminação!
E quem é Vittar? É um gay, magro, cisgênero e, que na personagem, é branco.
E daí? E daí que a postura simplória racialista, classista, corpórea e de gênero - já apontada e criticada acima - colocaria um indivíduo como Pabllo Vittar como menos importante ou menos representativo para defender a bandeira arco-íris.
E ele é tudo o que aquele discurso fragmentário e cancerígeno "rejeitaria" (nem sei por que coloquei as aspas aqui, já que é tão verdadeiro). Rejeitaria por meio dos mesmos princípios que dão base ao estereótipo, algo contra o qual tanto lutamos quando ele vem de fora do meio LGBT.
Portanto, quem ainda tenta dividir o movimento LGBT por dentro, você recebeu um 2017 repleto de K.O.
Levanta-te! E não cometa o mesmo erro! Aja com justiça todo dia!